terça-feira, 26 de outubro de 2010

Michel Foucault (Entrevista)

(Foucault) – Para mim, a literatura era um descanso, um pensamento a caminho, uma marca, uma bandeira... Ninguém analisou realmente como, da massa de ideias expressas, da totalidade do discurso real, a apenas alguns destes discursos (filosóficos, literários) são conferidas uma sacralização e uma função particular.

– Como se pode distinguir entre a boa e a má literatura?
(Foucault) – Essa é a pergunta com a qual devemos nos confrontar algum dia. Por um lado, teremos de perguntar o que, exatamente, representa esta atividade que consiste em difundir ficção, poesia, contos... Em uma sociedade. Também devemos analisar um segundo fato: dentre todas as narrativas, por que algumas delas são sacralizadas, postas a funcionar como “literatura”? São imediatamente assimiladas por uma instituição, que originariamente era bastante diferente: a instituição universitária. Agora está começando a ser identificada com a instituição literária.

– Nossa cultura confere à literatura um lugar que em certo sentido é extraordinariamente limitado: quantas pessoas lêem literatura?
(Foucault) - Porém, esta mesma cultura obriga a suas crianças, na medida que se aproximam da cultura, a passar por toda uma ideologia da literatura durante seus estudos. Há uma espécie de paradoxo nisso; o qual se relaciona com a declaração de que a literatura é subversiva. O fato de que alguém afirme que é assim, nesta ou naquela crítica literária, não tem importância, não tem conseqüências. Mas se ao mesmo tempo, toda a profissão docente, desde a escola primária até os chefes de departamentos universitários diz – explicitamente ou não – que para encontrar as grandes decisões da cultura, os pontos de flexão, se deve
apelar para Diderot ou Sade, Hegel ou Rabelais, pois se as encontraria ali. Neste nível se dá um efeito de mútua colaboração.


*Não pude deixar de tomar nota deste pequeno, mas glorioso comentário de Foucault:

Liberar-se a si mesmo da filosofia implica necessariamente uma similar falta de consideração. Não se pode sair dela fincando-se dentro dela, refinando-a tanto quanto possível, dando voltas ao redor dela com o próprio discurso. Não. Consegue-se isso, opondo-se a ela, com uma espécie de espanto e alegria, uma espécie de incompreensível crise de riso que no final se torna entendimento, ou que em todo caso, destrói. Sim, destrói antes de levar ao entendimento.

Bibliografia: “Foucault passe-frontières de la philosophie”. Le Monde, 6 sept. 1986. Entrevista conduzida por Roger-Pol Droit em 20 de Junho de 1975. Tradução de wanderson flor do nascimento.

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